Petrônio Braz é GRANDE. Sempre o será. Por isso, aqui fica a minha homenagem ao Homem e ao Escritor que teve a gentileza de me convidar para prefaciar a 2ª edição do seu romance "Serrano de Pilão Arcado - A saga de Antônio Dó", leitura obrigatória nos Vestibulares 2011-2012 da Universidade Estadual de Montes Claros - UNIMONTES - Brasil, e reverenciado pelo Atlas das Representações Literárias de Regiões Brasileiras, edição do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - 2º vol. - 2009.
É o prefácio que aqui vos deixo, do qual retirei agora as referências às páginas da obra nas quais se encontram as frases e expressões citadas:
Com a gentileza que sempre o caracterizou, o doutor Petrônio Braz endereçou-me o convite para prefaciar o seu livro “Serrano de Pilão Arcado - A Saga de Antônio Dó”, gesto que muito me honra e penhora. E se logo receei não estar à altura da obra deste grande nome da literatura brasileira, senti, do mesmo passo, que a profunda admiração que sempre nutri pelo percurso do doutor Petrônio Braz, me impelia a aceitar o convite.
O doutor Petrônio Braz, esclarecido como poucos e iluminado pelo brilhantismo que deposita em tudo quanto faz, tem pautado a vida pelo rigor e empenho com que abraça os seus projectos. Dono de uma invulgar cultura e de uma inextinguível determinação, supera-se a si próprio a cada instante. E se Deus descansou ao sétimo dia da criação universal, o doutor Petrônio Braz tem-se revelado imparável no seu processo de permanente criação. É fundador da Academia de Letras, Ciências e Artes do São Francisco (Aclecia), da qual é Presidente. É advogado, escritor, professor, assessor e consultor jurídico com profunda experiência no âmbito do Direito Administrativo, prestando consultoria a agentes públicos administrativos municipais e a professores de Direito Administrativo. Foi o único juiz de paz eletivo do seu município, alicerçado num profundo saber jurídico e numa experiência de mais de quarenta anos no mundo político e administrativo, desde que foi vereador e depois prefeito da sua São Francisco natal.
Autor de mais de quinze obras literárias, muitas das quais de literatura jurídica, o romance “Serrano de Pilão Arcado - A Saga de Antônio Dó” é fruto de vinte e três anos de aturado estudo do escritor sobre a vida e os feitos de Antônio Dó, de seu verdadeiro nome Antônio Antunes de França - o mais importante bandoleiro de Minas Gerais, e sobre os usos e costumes, as crenças, a indumentária e o linguajar do sertão baiano-mineiro.
Tal é o doutor Petrônio Braz!
Em “Serrano de Pilão Arcado”, o autor faz um resgate histórico da memória de Antônio Dó, indo ao encontro do homem que se escondia por detrás do jagunço. Aliás, o escritor inicia o romance com um episódio protagonizado pelos pais de Antônio Dó, o qual, a partir de então, passa a ser para nós, leitores, o filho de Benedito e de Sebastiana. Ao mesmo tempo que nos conta a vida de Antônio Dó, o escritor resgata um passado não muito distante de si, na medida em que seu pai - o eminente e saudoso historiador Brasiliano Braz, foi contemporâneo de Dó, sobre o qual também pesquisou e escreveu em “São Francisco nos Caminhos da História” (Belo Horizonte, Lemi, 1977.)
A obra que o leitor tem agora em mãos, inicia-se na fazenda do Salitre, em Pilão Arcado, no sertão baiano, onde Antônio Dó nasce e vive, e onde ajuda o pai na lida do gado. Mercê das secas que assolavam a região, do mal-de-secar que fustigava o gado bovino e da praga das saúvas que desfolhavam as árvores de fruto, Benedito decide vender as suas terras e partir com a família em busca de uma vida melhor. Corria o ano de 1878 quando a família parte para as terras de São Francisco, então conhecida como Pedras dos Angicos ou Pedras de Cima, aí chegando após 35 dias de viagem rio acima.
“Desde a chegada, Benedito ficou sabendo, ainda no porto, que o dunga do lugar era o Cel. Nunes Brasileiro, chefe dos chimangos.
Um canoeiro havia lhe informado:
- Moço! Aqui nas Pedra, tirante Deus, o homem forte é o Cel. Nunes Brasileiro.”
Por intermédio do Coronel Nunes Brasileiro, os Antunes de França adquirem direitos sobre consideráveis parcelas de terra às margens do rio São Francisco, que começam a lavrar, e compram algumas cabeças de gado. É assim que, à custa de um trabalho árduo, veem a sua vida prosperar; mas a pacatez da vida de Antônio Dó chegaria ao fim em 1909, quando Chico Peba, um seu vizinho que dominava a política local, combina com Maurício Rocha, um pequeno sitiante, apropriarem-se de um pedaço de terra de Arcângela - a companheira de Dó. Nesta contenda, Dó é humilhado pelo Capitão Américo que favorece os interesses de Chico Peba, e acaba sendo corporalmente agredido com chibatadas e preso.
Não satisfeito, Chico Peba acorda com Marcelino, “cunhado” de Antônio Dó, apropriar-se não só do gado deste, como também do gado da irmã e da companheira de Dó. Um dos irmãos de Dó - Honório, descobre tudo e é assassinado por Marcelino, homicídio este que ficaria impune.
Dó viria ainda a ter um outro conflito com Chico Peba, deste feita por causa de uma nascente de água, tendo as autoridades municipais, uma vez mais, tomado o partido de Chico Peba.
Revoltado com as humilhações por si sofridas e com a impunidade do homicídio de seu irmão, e verificando que as autoridades nada faziam para reparar as injustiças e punir os criminosos, Dó arregimenta, então, um bando de jagunços com o propósito de entrar em São Francisco e aí ajustar contas com Chico Peba, Marcelino e as autoridades locais e obter o ressarcimento dos seus prejuízos.
Não conseguindo obter o pretendido ressarcimento, inicia toda uma luta contra o despotismo dos coronéis, impondo pela força, a justiça nessa terra sem lei que era o sertão.
Neste período de cangaço, com os ânimos ao rubro na região sertaneja, devido a questões de disputas de terras e de gado, Antônio Dó passou a ser solicitado para exercer funções de “juiz de paz”, um “juiz popular”, numa simbiose entre o fora-da-lei e o agente da lei, dirimindo conflitos de interesses e utilizando a força da sua cabroeira para impor e fazer executar as suas decisões. Nesse“mundo-cão” – as palavras são do próprio Dó, o protagonista tinha para ele que era preciso acabar com o poderio dos “cachorros-do-governo”, expressão tantas vezes utilizada pelo jagunço para aludir ao poder instituído. Os mesmos“cachorros-do-governo” que Dó jurou a si mesmo que só lhe punham a mão em cima, morto. E o que é certo é que, aquele que ainda hoje é conhecido naquelas bandas, como o “Rei do sertão”, esteve à frente dos destinos das terras sertanejas durante dezanove anos, contra todos os contingentes militares que jamais o conseguiriam capturar, tendo, ao invés, o seu bando de cabras tirado a vida a centenas de militares enviados na caça ao homem. Por sentir que era um justiceiro, confessa, já quase no final da obra: “Carrego remorso na minha cacunda, não.”
Apesar de Antônio Dó ter falecido há setenta e oito anos (em 14/11/1929), a tradição oral dos contadores de histórias do sertão baiano-mineiro tem permitido que a sua memória e as suas façanhas atravessem o tempo e permaneçam vivas nas terras do São Francisco, numa clara demonstração de que o homem passa, mas o mito fica. Aos dias de hoje, chegaram lendas sobre os poderes sobrenaturais deste jagunço, como o de ter o corpo fechado por um patuá que lhe tinha sido oferecido por uma filha-de-santo e que ele trazia sempre consigo, o pacto celebrado com o Demo e o círculo desenhado no chão, dentro do qual os seus capangas estavam a salvo, em domínio à prova de bala. Ninguém mais indicado para fazer o resgate histórico da memória de Antônio Dó do que o doutor Petrônio Braz que, durante 20 anos, viveu e trabalhou na roça como agrimensor e percorreu a cavalo toda a região sertaneja em seu dia percorrida por Dó.
Senhor de uma rara sensibilidade e sempre atento à realidade envolvente do seu tempo, o doutor Petrônio Braz tributa o seu livro “aos pássaros, que voam livres pelos céus do vale do rio São Francisco; aos poucos animais silvestres, que ainda perambulam soberanos pelas suas vazantes e pelos seus cerrados; aos peixes sobreviventes, que povoam as suas águas; às árvores que até agora sobrevivem à devastação do homem; às veredas do Grande Sertão que ainda correm límpidas, com suas linfas cristalinas (…); às chuvas que, às vezes, caem sobre o sertão (…)”
Estamos perante uma obra literária escrita com mestria, à qual não podemos poupar encómios e cuja leitura constitui um must.
No alto dos céus, Maria Augusta está certamente feliz e orgulhosa do filho que deu ao mundo, e pedirá sempre a Deus que, com a sua luz divina, nunca deixe de iluminar o caminho à passagem deste Homem que, mercê do seu peculiar brilhantismo, irmana a divindade.
Bem haja, doutor Petrônio Braz, por ser quem é e como é, e que os “pássaros, que voam livres pelos céus do Vale do rio São Francisco” continuem a ser uma realidade viva.
Isabel Maria Cabral
Querida Isabel
ResponderEliminarQue bela notícia aqui nos traz. Em boa hora o fez, dando-nos conta de uma obra que privilegia os aspectos que mais caracterizam um povo:os seus mitos.Acredito que é nos mitos e nas lendas que nós nos encontramos e comungamos e sentimos aquela união necessária e comum.
Realmente, o autor de que nos fala, Petrônio Braz é GRANDE. Trabalhou durante vários e porfiados anos numa obra do interesse de todos e que foi reconhecida como fazendo parte integrante da cultura brasileira, sendo obrigatória a sua leitura a nível escolar.
Penso que é igualmente obrigatório para qualquer um de nós ler esse livro, o qual nos introduz naquele ambiente sertanejo de que apenas temos um vislumbre através das novelas. Por aqui se vê o quanto nos falta ainda em termos de conhecimentos no que diz respeito aos grandes autores brasileiros.
Muitos parabéns pelo excelente prefácio e muito obrigada por esta publicação que nos enriquece.
Beijinhos
Olinda
Isabel muito obrigado pela partilha.
ResponderEliminarBeijinhos
Maria
Quão imenso, é o nosso Brasil! Desconhecia totalmente, essa criatura extraordinária que é Petrônio Braz. Um trabalho de fôlego, profundo das agruras do sertão, dos jagunços, no vale do Velho Chico. Fez reportar-me à Grande Sertão - Veredas... Fiquei maravilhada, querida Isabel, com esse estudo tão profundo, da saga de Antônio Dó. Vou procurar esse livro, não posso deixar de ler. Parabéns, pelo excelente prefácio!
ResponderEliminarPor várias circunstâncias, estive ausente desse seu espaço. Agora, que nos reencontramos, virei mais vezes para me inteirar de outras publicações.
Beijos, com carinho e amizade,
da Lúcia
Querida Isabel
ResponderEliminarMuito obrigada pela sua visita, sempre com palavras belas que tocam o coração.
Desejo-lhe uma Dia da Mãe muito Feliz ao lado da Família.
A minha Filhota envia-lhe beijinhos. :)
Beijinhos e mais um grande abraço.
Olinda
Isabel passei para lhe desejar um excelente fim de semana.
ResponderEliminarBeijinhos
Maria
Um Prefácio Brilhante, minha querida!
ResponderEliminarParabéns. Um beijo
Graça
Olá Isabel
ResponderEliminarCá estou de novo, depois da mudança de residencia, que não me deixou tempo para mais nada durante 2 meses.
Belissimo prefácio, embora eu não conheça o escritor.
Beijinho grande
Teresa